domingo, 9 de maio de 2010

O negócio PT/TVI: uma história mal contada

Ao contrário das profecias precipitadas e interesseiras de alguns analistas e comentadores, apenas duas semanas de audições bastaram para justificar a utilidade e importância do inquérito parlamentar à tentativa de compra da TVI.
Mal querida e mal tratada pelo PS, a comissão de inquérito tem conseguido romper o muro de silêncio que esconde o negócio PT/TVI, apesar de sigilos, amnésias, cumplicidades e protecções.
Que sabemos, hoje, de novo sobre esta história mal contada, construída de equívocos, contradições e incongruências? Alguns exemplos:

1.Que houve uma primeira e fracassada tentativa de compra da TVI, a partir do Taguspark, liderada por Rui Pedro Soares, destacado membro do PS e administrador de ambas as empresas, operação de que a administração da Taguspark só foi informada quase dois anos depois.

2.Que, falhado o plano Taguspark, se lhe seguiu um plano B, tendo como comprador a PT e no qual o mesmo Rui Pedro Soares foi uma peça central.

3.Que, nesta segunda versão, a compra da TVI não era apenas uma transacção comercial mas incluía, também, a mudança de funções de José Eduardo Moniz, convidado por Zeinal Bava para consultor da PT. O seu afastamento da direcção da TVI, era um passo indispensável para a domesticação da sua linha editorial.

4.Que não foi nem a PT nem a Prisa que puseram fim às negociações entre a PT e a TVI mas sim o governo de José Sócrates que, à última hora, impôs a sua vontade à administração da PT, com receio de não poder iludir aos olhos da opinião pública a simpatia com que olhava e acompanhava este negócio e as suas implicações na TVI.

Em resumo, sabemos hoje mais do que sabíamos quando a comissão foi criada e começou a sua actividade. A comissão ainda não acabou os seus trabalhos: faltam audições, há documentos a chegar, esperam-se as respostas do primeiro-ministro. Ainda é cedo para tirar conclusões e afirmar algumas certezas. Mas julgo que, no final, perceberemos melhor, entre outras coisas, o que queria exactamente dizer Armando Vara quando afirmou que, se todo o país sabia do negócio PT/TVI, também José Sócrates o devia conhecer, mesmo que informalmente.
O país vive uma tremenda crise social e económica. Os portugueses estão sujeitos a uma enorme pressão para se resignarem perante o PEC de Sócrates, Passos Coelho e Paulo Portas e o que ele significa: redução de salários e reformas, cortes no subsídio de desemprego, diminuição dos apoios sociais, degradação dos serviços públicos, novas privatizações.
São certamente estas as preocupações que marcam o quotidiano da maioria dos portugueses. Mas, o negócio PT/TVI não é um problema político de menor dimensão. Os portugueses querem saber se é ou não possível em Portugal um governo utilizar uma empresa - onde o estado até tem uma participação determinante - como instrumento para influenciar a linha editorial de uma órgão de informação, no caso concreto, uma televisão, a TVI. A democracia não dispensa uma resposta, não pode deixar sem esclarecimento esta suspeição.
Também se enfrenta a crise, denunciando a perversão das relações entre o governo e as empresas participadas pelo estado, entre governantes e gestores, e combatendo a promiscuidade entre os negócios e a política. E, claro, defendendo a independência e autonomia da comunicação social.


João Semedo

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