quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Refinaria da Extremadura mais longe de ser uma realidade

Galp e turismo da região do Alqueva são os mais afectados com o projecto espanhol.

A Galp e os operadores turísticos da região do Alqueva podem, por mais algum tempo, respirar de alívio. A refinaria de Balboa, na Extremadura espanhola, que prometia ser uma concorrente directa damesma infra-estrutura da Galp em Sines, e um pesadelo ambiental para o desenvolvimento turístico, foi abandonada pela Caja Madrid e pelo Banco Bilbao Viscaya Argentaria (BBVA), dois dos principais bancos que integravam o consórcio que deveria financiá-la.
Um revés que se vem juntar à dificuldade do empresário Alfonso Gallardo, o qual juntamente com o governo autonómico é um dos seus promotores, em convencer o Ministério do Ambiente do país vizinho a dar definitivamente luz verde ao projecto.
A construção da refinaria de Balboa está agora parada, sem perspectivas de concretização, dando voz ao cepticismo que há muito grassa no sector petrolífero sobre a sua precária viabilidade económica. Orçada em dois mil milhões de euros, a refinaria não só está situada no interior da Península Ibérica, longe da sua fonte de abastecimento (o projecto inclui a construção de um oleoduto de 200 quilómetros que transportará o crude a partir do porto de Huelva), como se encontra inserida num núcleo de consumo pouco promissor, defendem as mesmas fontes. Cenário em que terá que competir com mais nove refinarias que já estão no terreno: cinco da Repsol, três da Cepsa e uma da BP, algumas delas em fase de expansão. Do lado português, existem outras duas: Sines e Matosinhos, ambas nas mãos da Galp.
Segundo o jornal espanhol “El Confidencial”, com a retirada do BBVA e da Caja Madrid, que tomaram esta decisão depois de terem pedido novos relatórios sobre o impacto que terá a nova refinaria, o núcleo duro do consórcio fica agora reduzido à Caja Madrid, Alfonso Gallardo e o governo autónomo. Accionistas que já afastaram a hipótese de realizarem um aumento de capital, embora continuem a afirmar que têm os fundos necessários para avançar, recusando a anunciar a morte do projecto.
O cronograma inicial apontava para o arranque de Balboa em 2011 e a criação de três mil postos de trabalho.
Usada como um trunfo pelo governo local no âmbito do xadrez regional, apesar demerecer a contestação dos ambientalistas, o projecto conta como apoio de alguns pesos pesados da política espanhola, como o ex-primeiro ministro socialista Filipe González e o ministro da Indústria Miguel Sebastián.
Em Portugal, a refinaria de Balboa sempre foi motivo de apreensão de agentes económicos, políticos e ecologistas. Em 2009, o Ministério do Ambiente português fez chegar ao governo da Extremadura um relatório, necessário à conclusão do estudo de impacto ambiental, onde dava conta das suas preocupações.

IMPACTO NACIONAL:

● O Ministério do Ambiente português já fez saber a Espanha que não vê com bons olhos o impacto ambiental que a refinaria de Balboa terá na região Alentejo e Guadiana.
● Para a zona do Alqueva estão projectados diversos empreendimentos turísticos, como a Herdade do Barrocal/Aquapura, Herdade do Mercador/Grupo Sousa Cunhal, Fortaleza de Juromenha/J7,SA,
Quinta da Sanfanha, Marina da Amieira e Parque Alqueva/SAIP.
● Balboa promete ainda actuar nalgumas áreas de influência da refinaria de Sines.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Os "abusadores" do costume...

Esta semana, o governo de Sócrates declarou que os medicamentos iriam ficar mais baratos em 8%, em resultado da aprovação de um novo decreto-lei. Assim dito, quase merecia um aplauso. Mas não é bem assim: aqueles que mais deles precisam - os mais pobres e os mais idosos - terão de pagar mais.
Até aqui vigorava um sistema segundo o qual alguns medicamentos eram comparticipados na totalidade, beneficiando muitas das pessoas incluídas nesses dois grupos. Com o novo decreto-lei, essa comparticipação passa a ser de 95%. Na leitura do governo, não é relevante que estas pessoas tenham de passar a pagar mais pelos medicamentos que compram. O que é relevante aqui é que com esta redução de 5% se está a combater os "abusos que se verificavam com esta comparticipação especial". Não deixa de ser contraditório o facto de o anúncio ser simultaneamente de baixa nos custos dos medicamentos e de corte na despesa pública. Se o governo tem como objectivo poupar 250 milhões de euros por ano com esta medida, é óbvio que essa poupança terá de sair dos bolsos de alguém.
Medida atrás de medida, na saúde como nos direitos sociais, é esta a mensagem que se quer fazer passar: acabe-se com os abusos! Como é que é possível continuar a fazer sempre o mesmo discurso e actuar de forma absolutamente inversa? Se esta semana o anúncio foi sobre os medicamentos, podemos lembrar inúmeros exemplos onde a mensagem foi exactamente a mesma: corte-se nos "abusos" das pensões; corte-se nos "abusos" dos subsídios de desemprego; corte-se nos "abusos" do rendimento social de inserção.
Uma administração pública mais rigorosa e mais transparente é um objectivo pelo qual todos devemos lutar. Fazê-lo passar, contudo, pelo sistemático ataque aqueles que menos meios têm, convenhamos, começa já a ser um abuso. As escolhas são sempre políticas. Haja, então, coragem para impor alguma justiça. Isso, sim, seria uma boa medida para evitar abusos.

Marisa Matias (Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga.)